domingo, 5 de janeiro de 2014

Ainda sobre Farinha de Mandioca.



Ainda sobre Farinha de  mandioca.
Desculpem se a temática de meu Blog possa  parecer repetitiva,  pois na verdade este  aprofundamento sobre o assunto visa dar aos visitantes distantes de saberem mais e com detalhes sobre nosso modo de vida.   O mapa Mundi,nos leva a admirar as situações geográficas e não podemos deixar de imaginar como seria bom que a tecnologia já tivesse alcançado o poder de transmitir por exemplo, cheiro, sabor das coisas mostradas pelos canais de TV mundo afora. Sei que já existe esta possibilidade, em caráter experimental, ou restrita a um pequeno número de privilegiados, mas quando se tornar comum por certo tudo será muito mais interessante. Aqui na pequena Cidade onde  moro, tive oportunidade de conhecer pessoas, oriundas da Europa, também da América do Norte, que pousaram aqui na condição de Cientistas, Misionários, ou simples Turistas Mochileiros, estes que realmente, ficam conhecendo o Mundo, pela condição de baixo poder aquisitivo, e assim, se mesclarem ao povo local, e ficarem conhecendo, seus costumes, e tipo de vida. Todos, sem exceção, se admiraram de  nossa Farinha, nem tanto pelo aspecto, mas sim pela importância que tem na alimentação, que não se completa sem ela.  A Amazônia por ser de bem grande, tem suas regiões distintas apesar de ser dominada pela maior floresta do Planeta, maior Bacia hidrográfica, maior rio, tem diversidade de flora, fauna e de seu povo. A Farinha por exemplo, na região do Vale do Jurua é de coloração branca e um tipo seca , muitas vezes bem caroçuda com caroços sem uniformidade de tamanho. É chamada seca pelo fato das raízes não precisarem ficar dentro d'água  antes de serem manuseadas no fabrico.  Do médio Solimôes para Baixo, ela tem a cor amarelada ocre, e seus caroços são esféricos e de tamanho uniforme, é a conhecida Farinha D'água. Como todos os produtos, ela é fabricada de tipos diferentes, tendo seleção e classificação por torragem, aspecto, e sabor. No tipo amarela se destaca uma de caroços pequenos conhecida por: Ova de Bodó [tipo de  peixe cascudo conhecido também como Acari]. A branca, tem sua melhor qualificação quando leva o nome Cruzeiro do Sul, em homenagem a produzida neste Município do Acre, embora a produzida em toda região seja tão boa quanto.   Fabricar Farinha é um trabalho artesanal, mas que custa muito esforço aos  agricultores. Geralmente, por morara em margens de rios com muita terra ociosa, sem tanta plantação e ocupação, pode o ribeirinho, a cada ano fazer um pequeno roçado em terras novas. Difícil utilizar por tres vezes, ou mesmo duas a mesma área. mas não se assustem. a floresta se recompõe com muita rapidez e, se a área na qual ele plante este ano, ficar dez anos inativa, será muito complicado o reconhecimento da derruba pois ali terá uma nova e exuberante selva.

              Como se  produz Farinha de Mandioca .
Saindo de casa bem cedo da manhã, o caboclo vai remando em sua canoa pequena em busca de uma terra boa para o novo roçado. Na canoa, além de uma latinha com pedaços de peixe frito e farinha, uma velha espingarda e um terçado fazem sua carga.  Sempre escolhendo uma área de terra firme, ele procura que ela tenha um curto espaço entre o Rio e seu roçado.   De volta  ao entardecer  ou a noite, ele sempre trás algum animal que abateu para o jantar, quase sempre um macaco.  No dia seguinte vai em busca de pessoas que trabalharão com ele, formando uma equipe de quatro ou cinco homens e tudo certo, na próxima manhã cedo se reunem para começar.   A floresta sempre muito densa, muitas árvores e uma infinidades de arbustos, cipós, e arvores finas [ Varas ], os homens tem que retirar todas para não atrapalhar a derruba. Vamos convencionar que esta equipe vai trabalhar, com  terçados e machados sem Motoserras, nesta primeira etapa que chamam: Broca,, a equipe vai demorar três   dias.  A derruba então começa e vai demorar duas semanas.Nas terras firmes, existem árvores imensas e duras de cortar, algumas vão ocupar o trabalho de dois homens por um dia inteiro. Paud'arco, Sucupira Preta, Moura Piranga, e outras que em alguns lugares tem bastante fazem o serviço se tornar lento e pesado.  Após as derrubas, algumas árvores não caem de vez, ficam presas por galhos ou cipós e se tornam um perigo para as próximas etapas de trabalho, e se faz necessário procura-las e concluir a derruba.  Geralmente o roçado é feito no começo do verão , tempo seco e sem chuvas, e com o sol fustigante dos trópicos, um mês de repouso e a mata está pronta para queimar.  Faz-se em torno de todo o roçado, uma estradinha limpa de metro e meio de largura, para impedir o fogo de avançar na selva, em uma manhã bonita de sol, depois de um mês a equipe volta a se reunir para atar fogo. Tem que se ter muito cuidado. Com o sol a pino, muito calor procura-se de onde vem um leve vento que seja, e então começa o fogaréu. Outros focos de fogo são acessos e logo toda a   esta transformada numa imensa fogueira. Queima durante um dia e uma noite. Passado um dia para esfriar, a equipe vem colher o que sobrou de galhos e gravetos, reunindo em feixes, e formando pequenas fogueiras para aproveitamento do máximo de terra limpa.  Este trabalho se chama : encoivarar, é um trabalho difícil pois, muitas vezes ficam montinhos de cinza, sem fumaça, e o desavisado trabalhador pode pisar em brasas que se acumulam por baixo, causando uma grande queimadura. Mais dois dias se passaram, agora os homens saem em busca de roçados que tenham mandioca pronta para colher, coletar hastes de arvores com muitos nódulos, fazer feixes e traze-los para passarem dois dias colocados em uma sombra para não secar a seiva.  No terceiro dia,  família vem toda crianças moças, mulheres, pois o trabalho é leve, vamos plantar.  Dos feixes cortam-se pequenos pedaços de aproximadamente dez centímetros cada, então mulheres com cestos seguem os homens que vão com uma enxada dando um passada, e fazendo uma pequena cova na qual a pessoa que vem com o cesto retira um pedaço e o coloca na hora, passando o pé, para cobrir,  Este trabalho feito por três pares em uma terra de um quarto de hectare, vai gastar três dias.  Passados estes, espera-se uma ou mais semana até cair a primeira chuva e a brotação  surgir.  O produtor vai esperar mais nove meses para começar a arrancar as raízes e produzir Farinha, isto em caso de apressar a produção pois o ideal mesmo é esperar onze ou doze meses.  O trabalho de arrancar do solo as raízes muda se a terra for a  primeira colha,  for uma Capoeira. Na terra nova, as raízes são maiores, e ficam quase sempre presas por baixo das outras raízes das árvores que foram abatidas e não tiveram tempo para de decompor. Algumas é preciso o agricultor, usar uma vara como alavanca para conseguir.  Na Capoeira, o trabalho maior foi o de manter limpo, pois nasce ervas daninhas com muita rapidez, e o dono do roçado tem que estar em atividade, quase  que diariamente. Como compensação, é muito fácil arrancar as raízes nem sempre grandes. Enquanto os homens arrancam e transportam para a casa de Farinha [a rústica fábrica], uma equipe de mulheres e as vezes crianças, esperam para raspar as raízes que serão lavadas e trituradas por um rolo de  madeira cheio de  finas tiras de aço nas quais, foram feitos dentes como em um serrote, e que gira impulsionado por polias vinda de um pequeno motor estacionário. A massa raspada, vai caindo em uma caixa de madeira e então levada para a prensa, onde perderá a água.   Na verdade sai um suco amarelado que se usa para fazer molhos, temperar certas comidas, e ainda  deste suco, extrair uma Farinha bem fina que serva para alimentação. A tapioca, o biju são  produtos desta farinha fina. Depois de prensada, a massa  é colocada em um forno feito de barro e finas varas,e no tampo dele, uma chapa de aço na qual se deposita a massa que um homem fica mexendo sem parar, e a medida que seca se forma a farinha.

 Conclusão  da produção de Farinha, e comercialização.
Com a farinha pronta, antigamente, acondicionavam em cestos [paneiros] feitos de cipós e forrados com folhas de Sororoca, uma miniatura das folhas de Bananeiras, com capacidade de trinta e seis litros. Agora existem estes sacos de tiras tipo  plástico, que acomodam 56  litros. Feito o enpacotamento, carrega-se para a margem do rio, aonde uma canoa vai levar uma parte para o consumo da família e a outra, para negociar, em troca de estivas, ou dinheiro,  Um roçado do porte deste que  descrevemos aqui, pode conter até seis mil covas de Mandioca e oferece alimentação para mais de um ano se não vender mais da metade. Para suster estas pessoas com alimentação, as vezes o dono da Farinhada tem um porco doméstico para o abate ou, duas pessoas ficam encarregadas de caçar ou pescar se perto tiver um lago com muitos peixes.  As mulheres que  trabalham na raspagem da mandioca, se não  pertencerem a família, são de famílias vizinhas e seus serviços são pagos com farinha. Os trabalhadores sempre trocam dias de trabalho, depois de feito um roçado, vão fazer o do amigo, até que todos tenham seus roçados. Existem naturalmente exceções, nas quais o trabalho é feito para receber em dinheiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário